Carmen Cupido
Um diminuto berço me recolhe onde a palavra se elide na matéria, na metáfora, necessária, e leve, a cada um onde se ecoa e resvala (Luiza Neto Jorge)
sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
Deste lugar onde, do alto do sono, o sonho alcança a vida
(Ausente de mim no sono, foto de Carla Salgueiro)
Clarim,
Não chames por mim
É cedo
Não toques a alvorada
Nem com um dedo
Minha alma alada
Cílios ao vento
Foge do tormento
Da madrugada
O sono é ninho, é regaço
E o sonho, papoila ondulante
Moçoila ao braço
Do seu amante
No alto do céu
Estrelas vagarosas
Que na cauda arrastam rosas
Até aos confins do meu peito
Recuso o leito
Da promessa vazia e vã
Da inóspita manhã
Que me dás
Já te disse Clarim,
Não chames por mim
Não esforces a melodia
A acordar cinzentos no ventre do dia
Deixa-me na noite, deixa-me dormir
Chama-lhe sonhar, chama-lhe fugir
Mas não me chames ao corpo,
Ao torpor, à dor
Viva da carne
Eu quero o peito repleto
Sentir-me dona de um céu sem teto
Suster o voo eterno
Afastar o inverno
Deste lugar onde, do alto do sono, o sonho alcança a vida!
(Carmen Cupido)
domingo, 12 de dezembro de 2010
Palavras que mato

Mordo
Mastigo
Engulo
Que o açúcar, o sal e o sangue
Das palavras que mato cá dentro
Saciem o silêncio
Que me mata
Morde
Mastiga
Engole !
(Carmen Cupido)
quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
Para além das horas

Porque te demoras, Amor?
Porque não vens?
Em que louvor de verso
Em que planeta reverso
Te perdes, te reténs
Qual o astro que encavalgas
Sem jamais descer
Ao chão da vida a decrescer
E o tempo a matar; E o Amor a morrer...
E o tempo a matar; E o Amor a morrer...
Demoras,
Para além das horas
Para além da dor, Amor
E já que não vens à curva do desejo
Onde eu te espero, onde eu te quero
Berrantemente beijo
A palavra em que te vivo e te invento!
(Carmen Cupido)
sábado, 4 de dezembro de 2010
À meia-luz

É em ti
Que o meu coração
Se pendura
E sem medir a acção
Pica, pica; Fura, fura
Cava, lavra, semeia
Centelhas na noite
E a primeira estrela
Logo se ateia
No alto de ti
Que para mim és céu...
Bate, bate o coração
Bate o meu, bate o teu
É uníssono o som
Das harpas que soam
No fundo das íris
E até as veias
Limpam as teias
Para que o sangue dance
À meia-luz!
(Carmen Cupido)
quinta-feira, 2 de dezembro de 2010
Massa sem jeito

Toma o meu corpo, Amor
E desculpa a hóstia amarga
Desta massa sem jeito
Oxalá tuas mãos, Amor
Lhe dêem o jeito
Das flores que me bailam no peito
Oxalá teus olhos, Amor
Passem sem ver a carne disforme
Para somente reter a luz
Que nas formas se funde
Dou-me, num abandono nu
E o vestido é tão cru
Que não se adivinha
Que o seio pendente é afinal uma estrela cadente
Que a coxa grossa e colada é planície semeada
E a barriga redonda, ai Amor é onda
Pronta a enrolar-se...
Sabes, Amor
Que nesta hora, até o arrepio cora
Nos poros, na pele; e o corpo ora
Porque não tem onde
E a carne, onde se esconde?
Toma o meu corpo, Amor
E desculpa a hóstia amarga
Desta massa sem jeito
Dou-te tudo de mim, Amor
A pureza, o sol, o fruto, o sabor
Tudo o que tenho
E se de mim medires o tamanho
Que seja só o do coração!
(Carmen Cupido)
quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
Ai os meus olhos a salivar

Vou
Escutar por dentro
A palavra Amor
A desabrochar...
Estender os ramos
Como quem estica os braços
Para nos abraçar...
E eu, aqui sentada
Nos teus lábios, ferrada
Beberei, ávida
A aurora orvalhada
Do seu eco...
Ai os meus olhos a salivar!
(Carmen Cupido)
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