quinta-feira, 18 de março de 2010

Amen


(Rezar, Fundo de ecrã de olivierelissalt)


Despiste-te de mim, aflito
Ausente maldito
E como um velho vestido, estorvo, empecilho
Assim caí eu, farrapo, a teus pés...

Vai-te! Não te aguento!
Vai, ó espavento, com o primeiro vento
E que o diabo te carregue

Odeio a nuvem demente
Que sempre vai a contrário senso
Da minha ânsia, que te roga presente
Em cada gota de chuva que rega, que cega os meus olhos
Odeio!

Vai! E se voltares
Olha-me, olha-me bem:
Uma incubadora de larvas é o que fizeste de mim
Que me devoram em vida, nem sequer fria, ainda quente
Enfartando, alegremente
A pança ao bicho solitário...

Larvas, sim...
Nojentas, depravadas
Falsas as Musas, negras as Fadas
A ferrar o dente no que sou, no que sinto
Até que meu pranto; Num mórbido canto
Expulsa o feto poema das entranhas das palavras...

E a caminho,
Põem seus ovos, constroem seus ninhos
Nos altos ramos do céu da minha boca
Hóstias de fel que sugo à força
É a clarividência das pedras e dos espinhos
Que me deixaste no lugar da tua presença
A meter seus dedos na minha garganta

Fundo, tão fundo...
Até que num doloroso espasmo
Meu ventre, meu corpo, meu todo em marasmo
Vomita, se desfaz, se esvazia
Em rios de purpúrea poesia

E ainda devo vergar e dizer-te:
Ámen?

(Carmen Cupido)

5 comentários:

  1. Vergar perante musas que aprisionam os gritos, e fecundam os silêncios de poesia!
    Intenso nasceu o poema!

    Bjs deste lado de cá dos Alpes...

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  2. Vinha por outro ratito e... caiu-me este tijolo de raiva na cabeça. Doi!!!

    Beijinho
    João

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  3. Que grito!!!! Nada se deve trancar! Faz mal... por isso existem os papeis, as canetas... eles não foram inventados apenas para escreverem a história do homem, da economia, da politica, da sociedade, da arquitectura...

    se é permitido ao homem escrever, filmar o horror das guerras, os genocídios... então porque não há-de ser permitido ao homem vociferar as suas próprias entranhas...

    bju

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  4. Minha querida
    Que grito , num lindo poema, adorei.

    Beijinhos
    Sonhadora

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  5. Belíssima poesia, como todas que encontro nesse confortante espaço.
    Grande abraço e sucesso!

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